O Hamas, tal como o Hezbollah e os Hutis, são “proxys” do Irão, através dos quais este promove a instabilidade e o conflito no Médio-Oriente, em função dos seus interesses, e mais recentemente também em articulação com a Federação Russa, como revelam as recentes visitas de representantes do Hamas ao Kremlin, e o fornecimento de armas pelo Irão ao regime russo.
É difícil escrever sobre o Médio-Oriente, e sobre o conflito entre israelitas e os palestinianos em particular. A complexidade da questão é grande, e consequentemente é igualmente grande a hipótese de não se conseguir atingir uma abordagem correcta.
Desde logo, ambos os lados têm uma reivindicação legítima aos territórios em disputa: os palestinianos porque já estavam neles instalados há centenas de anos, os israelitas porque os mesmos correspondem ao seu espaço histórico desde tempos imemoriais. A isto acresce que, para ambos os lados, aqueles territórios, e Jerusalém em particular, têm um profundo significado religioso.
Depois da Segunda Guerra Mundial e do Holocausto, era impossível negar ao povo judeu uma pátria própria, e o território de Israel era a escolha óbvia, por duas razões: por um lado por razões históricas, e por outro lado porque a Palestina não correspondia ao território de nenhum estado independente, mas antes a um protetorado internacional administrado pela Grã-Bretanha.
Ambos os lados foram reciprocamente agressivos desde o início do conflito, tendo praticado terrorismo durante o período de administração britânica.
Pouco depois da 2ª Guerra Mundial, as Nações Unidas – num raro exemplo de convergência entre os EUA e a URSS – votaram uma resolução preconizando a solução dos dois estados, ainda hoje não concretizada, e que infelizmente parece não corresponder a vontade de nenhum dos lados. No entanto, na altura, os israelitas aceitaram essa solução, e fundaram o estado de Israel, ao passo que os palestinianos e os países árabes a recusaram, e por isso não foi fundado um estado palestiniano. Erro crasso.
Em vez de apoiarem a fundação de um estado palestiniano, os países árabes tentaram, por duas vezes, destruir Israel militarmente, e em ambos os casos falharam. Essas guerras tiveram como resultado a expansão do território ocupado por Israel, que ocupou os montes Golan a Norte, junto da Síria, e alguns territórios a Sul, junto do Egipto, com fundamento na necessidade – bem real – de ter fronteiras seguras de modo a poder garantir a sua defesa militar em caso de ataque. Mas depois, Israel continuou a expandir os territórios ocupados, nomeadamente através dos colonatos ilegais na Cisjordânia, acossando cada vez mais os palestinianos.
A brutalidade recíproca continuou durante as décadas seguintes, atenuada por um período de paz e concertação relativas entre Israel e a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), o que em 1994 valeu o Prémio Nobel da Paz para o então primeiro-ministro israelita Itzhak Rabin, para o seu antecessor Shimon Peres, e para Yasser Arafat, na altura líder da OLP. Sucede porém que o primeiro veio a ser assinado, e a OLP, entretanto transformada em Autoridade Palestiniana e encarregue da administração civil da Palestina, foi gradualmente suplantada e literalmente eliminada na Faixa de Gaza pelo Hamas, mantendo-se na Cijordânia.
O Hamas, tal como o Hezbollah e os Hutis, são “proxys” do Irão, através dos quais este promove a instabilidade e o conflito no Médio-Oriente, em função dos seus interesses, e mais recentemente também em articulação com a Federação Russa, como revelam as recentes visitas de representantes do Hamas ao Kremlin, e o fornecimento de armas pelo Irão ao regime russo.
O ataque do Hamas de 07 de Outubro, com massacre de civis, tomada de reféns e a inevitável resposta israelita, chegámos à actual e calamitosa situação humanitária em Gaza.
Ao esconder os seus activos militares em hospitais, instalações da ONU, ambulâncias, escolas, (etc.) o Hamas sonegou a estes locais a protecção legal de que os mesmos deveriam beneficiar à luz das leis da guerra. Com efeito, a protecção conferida a estes locais e equipamentos pressupõe que os mesmos têm natureza não militar, que são particularmente indefesos, e dedicadas a fins humanitários. Quando pelo contrário são usados como instalações militares ou instrumentos de guerra, tornam-se alvos militarmente legítimos.
Por seu lado, Israel não tem mostrado contemplações, nem sensibilidade para com as questões humanitárias e os danos colaterais, estando unicamente focada na eliminação do aparelho militar do Hamas, e na recuperação de reféns, cada vez mais improvável à medida que o tempo passa.
Mas de quem é a responsabilidade de defender os civis palestinianos? De todos, certamente, mas em diferentes graus.
Israel, como potência ocupante e exército de um país democrático civilizado, tem que se comportar pelos padrões correspondentes, ou seja, tem que respeitar o direito humanitário da guerra, e tem que minimizar as perdas civis na maior medida possível, o que parece não estar a fazer.
Mas o Hamas, como entidade governante da Faixa de Gaza, e como suposto defensor do povo palestiniano, devia ter esse desiderato como primeira prioridade. E claramente não tem, antes se focando no objectivo da total eliminação de Israel, a qualquer preço ou custo para a sua própria população, que chega a usar como escudo humano.
Os países árabes – desde logo o Egipto, mas não só – poderiam receber refugiados da faixa de gaza, mas a verdade é que não o querem fazer, sobretudo por receio de serem infiltrados por militantes do Hamas… ou seja, por agentes do Irão, a potência regional com aspirações hegemónicas.
Parece razoável o entendimento segundo o qual a solução para a questão palestiniana será a solução de dois estados, mas esse objectivo será difícil de concretizar, porque implica grandes cedências de parte a parte, e pelo menos durante os primeiros anos, uma força militar neutra de interposição entre os dois países.
Israel teria que ceder território, pelo menos os territórios ilegalmente ocupados na Cijordânia, e possivelmente também o território necessário para ligar por terra a Faixa de Gaza à Cijordânia.
Os palestinianos teriam que reconhecer o domínio de Israel sobre o seu restante território.
E ambas as partes teriam que aceitar uma força militar neutra (por exemplo, egípcia, saudita e jordana), que sob a égide da ONU fosse capaz de manter a segurança no novo estado palestiniano, impedindo abusos por parte de Israel, mas também o estabelecimento na palestina de movimentos islâmicos radicais (nomeadamente, mas não só, dos “proxys” do Irão) que aspirassem a usar o novo estado como base ou ponto de partida para ataques a Israel.
Solução que só será implementável depois da prévia eliminação ou rendição do Hamas, e de um acordo na ONU que envolvesse os principais países da região, nomeadamente os que ficassem responsáveis por assegurar a segurança e defesa no novo estado palestiniano.
Razões pelas quais, infelizmente, a solução dos dois estados e a paz na região parecem estar ainda dolorosamente longe.