O perigo é o de abrirmos a porta ao populismo, disfarçado sob a pele da normalização, como temos vindo a assistir na presente campanha das eleições europeias. Esse perigo é aumentado por um outro facto: o radicalismo de direita, quando vamos a votos, vai às urnas em massa.
É curioso pensarmos que sem votos não há democracia. O “voto” evoca sentidos, é a nossa visão e a nossa voz em determinado momento e em última análise, evoca o sentido humanista da cidadania e da responsabilidade cívica. Para além disso, um processo democrático eleitoral é bastante simples: é pelo voto que damos voz à visão com que nos identificamos na vida política.
Por este processo ser tão claro e tão descomplicado, até do ponto de vista da sua execução (votar nunca foi tão fácil como hoje), custa-me aceitar que haja quem se demita voluntariamente de tal direito. É possível identificar as causas desse fenómeno, é claro. Passa logo pelo distanciamento temporal e histórico do momento em que o direito ao voto foi conquistado. Só como exemplo, qual terá sido a taxa de abstenção das primeiras eleições livres? Muito baixa certamente, banalizámos o voto mas continua a ser absolutamente necessário para a nossa representação.
A memória do momento da conquista do direito ao voto, ao esbater-se ao longo do tempo, torna-se por vezes quase como que desvalorizada. O perigo é o de abrirmos a porta ao populismo, disfarçado sob a pele da normalização, como temos vindo a assistir na presente campanha das eleições europeias. Esse perigo é aumentado por um outro facto: o radicalismo de direita, quando vamos a votos, vai às urnas em massa.
Não quero com isto dizer que o voto deva ser um concurso de fé. É simplesmente uma escolha, que não tem de ser sempre a mesma e que, também por isso mesmo, é um risco e uma aposta que assumimos. Digo apenas que, se a democracia é, de facto, um projeto de todos e para todos, é impossível concretizá-lo apenas com alguns e para esses alguns. Tão simples quanto isso.
Aos que apontam as falhas da democracia, devemos responder que a história europeia e mundial tem demonstrado que a democracia continua o melhor sistema político que temos tido. Aos eurocéticos, não será adequado responder perguntando que prosperidade houve no “orgulhosamente sós”?
Mais do que os partidos políticos e dos rostos, vozes e visões que lhes associamos, é cada vez mais a democracia que precisa de votos. Se até errar é humano, porque é que votar não pode sê-lo? Os slogans têm o valor que têm. Mas eu arrisco e voto neste, inspirado no do americano Uncle Sam, mas com um objetivo bem mais nobre: “A democracia precisa de si!”