O Partido Socialista está no caminho certo ao considerar que a decisão do reconhecimento do Estado da Palestina por parte de Portugal reflete o sentimento maioritário do povo português e poderá contribuir para a resolução do conflito israelo-palestino. Sem a criação do Estado da Palestina, o Estado de Israel viverá sempre numa situação de grande precariedade existencial.
David Grossman é hoje, provavelmente, o escritor israelita vivo mais conhecido no mundo, com obras traduzidas em 42 línguas. No primeiro dia do mês passado, deu uma entrevista em que, visivelmente agastado, se referiu pela primeira vez à campanha de Israel em Gaza como “genocídio”. Afirmou que era a primeira vez que o fazia, depois de anos sem o conseguir, e que se sentia “destroçado” ao fazê-lo.
Em seguida, disse que a palavra “genocídio” era uma avalanche. Não me ocorrem melhores palavras para descrever este conflito. Cada vez se torna maior e cada vez gera mais sofrimento, acumulando destruição a cada volta que dá sobre si mesmo.
É claro que todas as imagens, testemunhos e histórias deste conflito, pautadas pelo horror, nos enchem de tristeza, desânimo e preocupação. Mas somos obrigados a constatar algo mais, que tem tanto de perigoso como de assustador: a atual situação em Gaza é a demonstração cabal da falência de todas as instituições e de todos os esforços, ao longo de décadas, concertados em direção à paz.
Habituámo-nos, por via da tradição cultural e histórica ocidental, a olhar para Israel como a vítima e como um grupo historicamente oprimido, algo que é factual e amplamente documentado. A ideia de que seja agora a vítima, o oprimido, a tornar-se o agressor e o opressor é tão paradoxal que quase parece inconcebível. No entanto a realidade está aí – a humanidade raramente aprende com o trauma. Pelo contrário, este último, com frequência, aprofunda a divisão e alimenta o ódio.
Indagar as razões históricas deste conflito, recuando quase até ao Rei David, não é útil. A conclusão mais correta e sábia é a de que a paz entre Israel e a Palestina é algo que ambos merecem e que apoiar as resoluções da ONU, no quadro do direito humanitário internacional e do multilateralismo continua a ser o melhor caminho.
O Partido Socialista está no caminho certo ao considerar que a decisão do reconhecimento do Estado da Palestina por parte de Portugal reflete o sentimento maioritário do povo português e poderá contribuir para a resolução do conflito israelo-palestino. Sem a criação do Estado da Palestina, o Estado de Israel viverá sempre numa situação de grande precariedade existencial.
Mais do que nunca, quer a nível da cidadania, quer a nível institucional, importa, sobretudo, que não sejamos testemunhas silenciosas das atrocidades da História, como tantas vezes fomos no passado. O mundo falha e Gaza morre. Com ela, morre a nossa dignidade. Gaza precisa de paz, não de silêncio — fim ao genocídio, já!