Kate Middleton e o Cancro em Pessoas Jovens: Epidemia?

José Padrão Mendes, Médico Neurologista, Médico Intensivista, com especial interesse na Patologia Cardiovascular, Neuropsiquiatria

O que esta situação demonstra, o que se está a passar com Kate, parece ser cada vez mais comum entre pessoas jovens. A princesa Kate talvez seja uma das faces mais mediáticas. Quando digo jovens, falo de pessoas entre os 20 e os 39 anos (a princesa tem 42 anos) que desenvolveram cancro.

Desde há umas semanas, nas revistas cor de rosa Britânicas o grande tema era o “desaparecimento” da vida pública da princesa de Gales, Kate Middleton. Muitas teorias se escreveram, até uma possível traição por parte do marido.

Mas a verdade demonstrou ser bastante mais sensível e com outro alcance: depois de fazer uma cirurgia abdominal (que pareceu ser de rotina) foi descoberto um cancro. Esse cancro, ao que tudo indica ainda em fase inicial, já está neste momento a ser tratado com quimioterapia.

Pouco ou nada se sabe sobre que tipo de cancro é, que tratamento está a fazer a princesa ou qual o prognóstico.

Acredito que neste momento difícil para a casa real Britânica, depois do diagnóstico de cancro do rei e mais esta terrível noticia, devemos deixar a família real em privacidade lidar com toda a difícil situação.

Kate Middleton, Princesa de Gales, informou em vídeo que tem cancro, para pôr fim a meses de ausência e especulações na imprensa

O que esta situação demonstra, o que se está a passar com Kate, parece ser cada vez mais comum entre pessoas jovens. A princesa Kate talvez seja uma das faces mais mediáticas. Quando digo jovens, falo de pessoas entre os 20 e os 39 anos (a princesa tem 42 anos) que desenvolveram cancro. O cancro é uma doença tipicamente da idade avançada, em pessoas com mais de 50 anos. Mas nos últimos anos temos visto uma tendencia preocupante emergir.

Já no ano passado foi divulgado um estudo desenvolvido entre 1990 e 2019 da BMJ Oncology (Global surge in cancers among the under 50s over past three decades | BMJ) em que se declarava uma subida de quase 80% da  incidência de cancro em pessoas com idades entre os 20 e os 39 anos, com o número de mortes a subir quase 30%.

Acabamos de sair de uma Pandemia, mas os problemas de saúde das populações não parecem que estejam a melhorar e agora tudo indica que estamos a entrar numa fase de epidemia de cancro.

A situação em Portugal também demonstra muito bem a situação a nível mundial: no Hospital Santa Maria, o maior hospital público português, a ala de oncologia não consegue responder convenientemente a tamanha explosão de cancro na sociedade. O Prof. Luís Costa, diretor de serviço, já veio dizer que o departamento está a rebentar pelas costuras. Com mais de 6000 casos em tratamento simultâneo, é muito difícil atender adequadamente todas as pessoas, ainda para mais numa situação de extrema fragilidade em que se encontra o SNS.

É a tempestade perfeita: uma população envelhecida tem tendencialmente mais casos de cancro, mas quando este também começa a afetar pessoas mais jovens, então a situação poderá ser muito complicada.

O novo governo já foi escolhido e a futura ministra da saúde não vai ter vida fácil, além do crónico sub-financiamento do SNS, falta de recursos humanos e uma população com uma demografia claramente desfavorável, agora ter de lidar com uma epidemia de cancro em idade tão jovem será um grande desafio.

As causas para esta explosão de cancro não são conhecidas, apenas existem suposições e teorias. Entre elas figuram a evolução da nossa alimentação para alimentos super processados e fast food, a nossa crónica falta de exercício físico, a vida extremamente stressante, a poluição, o uso abusivo de pesticidas, de hormonas e de antibióticos na produção de alimentos, o cada vez maior nível de radiações a que estamos expostos diariamente, o consumo de tabaco e de álcool… Um dos resultados do estudo foi que este aumento de cancro foi mais marcado nas mulheres e há quem defenda que a generalização da toma de anticoncepcionais hormonais possa também ser uma causa do aumento da incidência de cancro em mulheres jovens, mas também o facto de as jovens mulheres terem aumentado o consumo de tabaco e de álcool no período em estudo em comparação com gerações anteriores.

Tudo teorias em que nenhuma foi realmente comprovada. Possivelmente todo o problema será devido a uma combinação da maioria ou mesmo de todas as causas citadas. Mas mais estudos serão necessários.

Também há quem defenda que nas últimas décadas a capacidade e a evolução das técnicas de diagnóstico e o acesso da população à saúde aumentou exponencialmente o diagnóstico de cancro e, derivado dessa melhoria da saúde, foram detectados mais casos de cancro em pessoas jovens que de outra forma ficariam por diagnosticar e tratar.

Também eu tenho reparado que cada vez gente mais jovem tem sofrido de cancro, um colega gastroenterologista num hospital do norte do país, em conversa informal, demonstrou estar preocupado com o aumento do número de casos de cancro cólon em pessoas com idade inferior a 40 anos. Quase todas as semanas diagnosticavam um doente e, que com essa tendencia em mente, muitos jovens especialistas de gastroenterologia com menos de 40 anos já se tinham submetido a uma colonoscopia de rastreio. Há que ter em conta que o recomendado é fazer esse rastreio a partir dos 40 anos em casos de parentes em primeiro grau, como pais ou irmãos, que apresentaram a doença.

Sabemos que o melhor a fazer para tentar resolver este problema é a prevenção e o rastreio precoce. Quanto mais precocemente se detectar o cancro, maior a probabilidade de cura. Mas ainda este ano ficámos a saber que o governo perdeu financiamento para rastreio do cancro do pulmão (Governo perdeu financiamento para rastreio do cancro do pulmão – Observador), um dos que mais mata em Portugal.

Temos de investir na prevenção, a população tem der sensibilizada para hábitos de vida saudáveis como uma alimentação saudável, exercício físico regular (a OMS recomenda 30 minutos de atividade física diária moderada), dormir bem… Também se tem de investir na prevenção de doenças como o papilomavírus que está provado provocar o cancro do colo do útero nas mulheres, mas também pode provocar cancro do pénis, vulva, anus e orofaringe. No futuro vão-se desenvolver novas linhas de investigação, como o equilíbrio da microbiota intestinal e o efeito dos microplásticos na saúde humana, que poderão trazer novas terapias e outras forma de prevenção do cancro.

Não quero causar alarme, apenas informar e chamar a atenção para esta problemática que pode vir a ter consequências graves no SNS, mas também na nossa sociedade se realmente esta tendencia se mantiver ou piorar e não se inverter. São necessários mais estudos, mas também a população tem de começar a ter noção do que pode fazer para prevenir esta possível epidemia com graves consequências.

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