Flávio Pansieri: “O aumento dos movimentos populistas nas Américas e na Europa está relacionado com um défice de legitimidade dos representantes”

Marta Roque

Entrevista a Flavio Pansieri, Professor Adjunto de Direito Económico da Escola de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, ao Magazine Estado com Arte, à margem da Conferência “Governança e Constitucionalismo Digital” reuniu académicos, juristas, representantes do poder político do Brasil e da Europa, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), de 26 a 28 de junho, onde foram abordados os temas de inovação e limites da inteligência artificial na governação, regulação do ciberespaço, liberdade de expressão e responsabilidade das plataformas digitais. 

Comenta nesta entrevista que o Tribunal Federal do Brasil já utiliza há alguns anos inteligência artificial com dois robots, neste momento estão a fazer testes para um terceiro robot, com intuito de melhorar a gestão do Supremo Tribunal Federal. 

 Considera que o avanço dos populismos nas Américas e na Europa devem-se a “défice de representação nos poderes políticos e legislativos”, o que abre espaços para grupos organizarem “discursos fáceis”.

Em que medida o Brasil está a usar a inteligência Artificial no Direito e nos tribunais?

No Brasil já é uma realidade a Inteligência Artificial nos tribunais há alguns anos, especificamente o Supremo Tribunal Federal tem utilizado, desde 2017, dois instrumentos de inteligência artificial, são os robots Vítor para repercussão geral, faz a triagem de material de recursos de todo o país e o robot Rafa desenvolvido em razão da 20/30 da ONU.  O STF utiliza para classificar os processos como um dos objetivos de desenvolvimento sustentável, definidos pela ONU.

O STF está a fazer testes para mais um robot chamado Vitória que tem como objetivo melhorar a gestão de precedentes do STF. Estes 3 instrumentos são uma realidade, o STF tem diretoria e assessoria de desenvolvimento de inteligência artificial dentro da Secretaria de Tecnologia e gestão de precedentes, tem sido um sucesso a utilização destas tecnologias artificiais, como ordenação e celeridade no sistema jurídico brasileiro.

Que impactos se sentem hoje no direito brasileiro com o ataque aos 3 poderes da democracia a 8 de janeiro em Brasília?

Os eventos ocorridos a 8 de janeiro com ataque aos 3 poderes trouxeram impactos ao ambiente democrático brasileiro. Trazendo uma tensão institucional ainda maior do que vivíamos no ano anterior, fazendo com que o STF avance com medidas no objetivo de conter esses grupos não comprometidos com a democracia com a ordem constitucional brasileira. Esse sentimento nacional, de alguma forma se encontra dividido, uma pequena parcela que apoiava aqueles movimentos de 8 janeiro, hoje sentem-se atingidas pelas medidas tomadas pelos participantes do grupo, enquanto aqueles no lado oposto comemoram tal medida. No meio disso  fica a maior parte da população que espera a pacificação nacional de volta a normalidade institucional brasileira, esperando especialmente nos seus principais atores o STF e o Congresso Nacional, protagonistas no processo de auto-contenção e de estabilização nacional.

Como analisa o aumento dos populismos nas américas e Europa? O que faz suscitar os extremismos?

O aumento dos movimentos populistas nas américas e na Europa está relacionado com um défice de legitimidade dos representantes, sejam no poder executivo, bem como nos poderes legislativos, esse défice de representação abre espaços para grupos, que organizem discursos fáceis, tentem encontrar soluções ainda mais fáceis para a problemática que vive a democracia institucional ocidental. Essa ausência de perceção da legitimidade de poder por parte da coletividade tem permitido um avanço de um populismo. Nos últimos anos é direcionado a grupos organizados, mas à direita ou mais à esquerda, tornando uma massa de centro democrática nos países sem representatividade, na medida em que essa polarização acaba por achatar essa estrutura central, que deveria estabilizar as relações democráticas nos países.

O extremismo tem sido suscitado a demandas sociais, seja de grupos identitários ou grupos que não sentem representados pelas políticas estatais, em todas as políticas da Europa e das Américas. O que faz surgir um sentimento de indignação que desemboca em ideias ou ações extremistas nas democracias constitucionais.

Que moderação pode exercer o Estado de Direito face a estes movimentos no Brasil?

O Estado constitucional de Direito, a própria estrutura de governo que tende a fornecer educação e formação para a cidadania para toda a coletividade, em especial deve o Estado também nesses momentos de maior tensão democrática agir dentro da institucionalidade, fazendo respeitar as regras constitucionais e legais e conter estes movimentos, que por sua vez pretendem o rompimento com a democracia. Por certo,  a manifestação deve ser plena, mas quando pretende pôr fim ao próprio processo democrático não há que se discutir a sua ilegitimidade, pois não se pode discutir com os querem a rutura institucional.

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