Não invejem a alegria

Paulo Caiado

Há muito que perdi a Fé e ninguém o pode lamentar mais do que eu próprio. A Fé ajuda-nos a esperar por algo mais que aquilo que podemos fazer por nós próprios. A esperar ajuda para algo que já não está nas nossas mãos. A acreditar que alguma entidade olha por nós como um Pai ou uma Mãe. Que não estamos sós. Que há a quem pedir e que há a quem agradecer. Que há uma razão para tudo. A Fé traz-nos optimismo em tempos difíceis, diz-nos que melhores dias virão. Sem a Fé estamos sozinhos no mundo e é só connosco que podemos contar.

A ausência de Fé leva-nos a acreditar que a vida é completamente aleatória e pouco está nas nossas mãos para determinar o nosso destino, que a sorte e o azar definem muitas vezes o nosso tempo de vida.

Já teci as minhas críticas ao volume de investimento público nas Jornadas Mundiais da Juventude e o escândalo dos primeiros orçamentos que, já depois de eu ter escrito sobre o assunto, foram muito revistos em baixa. Sem Fé nada me leva ao encontro dos eventos da JMJ mas inevitavelmente os participantes vêm até mim. Jovens e menos jovens de todo o mundo enchem as nossas ruas de cânticos e de sorrisos, de abraços e empatia. São manifestações de felicidade incontornáveis e é impossível resistir a essa onda de alegria.

Ontem dei por mim a cantar e a bater palmas com eles. Eram dezenas de várias nacionalidades unidos por um objectivo e um sentimento comum. Invejo-lhes a Fé tanto quanto lhes invejo a esperança que colocam no futuro. Importámos alegria para Portugal por estes dias. Quem dera que pudessem todos ficar por cá. Quem dera que os nossos não tivessem de partir daqui em levas anuais ao encontro dos seus sonhos.

Somos um país que está a perder a Fé e que também está a perder a alegria. Uma coisa é discutir o retorno material de investimentos públicos e outra coisa é discutir a felicidade. Ao invés de ver as pessoas a comungarem desta alegria contagiosa que se instalou nas nossas cidades e vilas só leio comentários de azedume sobre as manifestações dos jovens participantes nas JMJ. Eles trazem cânticos, sorrisos e abraços, trazem empatia. O que há a criticar sobre isso? Posso ter perdido a Fé em algo divino mas não perdi a Fé na nossa capacidade de sermos felizes.

Entre os que espraiam o seu azedume e aqueles que oferecem amor e alegria eu não tenho dúvidas no meio de quem quero ficar e tenho pena de ter perdido a Fé e não me achar no meio deles naqueles relvados de Lisboa. Sei que muitos irão lá estar por ser o momento e encararão as Jornadas com espírito festivaleiro.

No futuro falarão desta semana como alguns jovens americanos falavam de Woodstock. Mas serão poucos os que não deixarão de ser tocados pela alegria e espiritualidade envolventes. Se isto os ajudar a ser pessoas boas sem almejar a recompensa divina ou temer o castigo do inferno, se os vier a tornar verdadeiros cristãos sem necessitarem sequer de acreditar em Deus, então as Jornadas terão feito o seu papel e não há dinheiro público nenhum que pague isso.

  • Consultor de Gestão

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