Catarina Barosa, fundadora e directora criativa do projecto Líder, está na organização do Festival internacional Espanto, dedicado à Filosofia, que terá em junho a sua primeira edição em Portugal com o tema “O Medo”. Em entrevista ao Estado com Arte Magazine diz que há uma lacuna deste tipo de iniciativas no nosso país, e que já acontecem em muitos outros países há muito tempo.
A seu ver a faculdade de pensar pode estar em crise pela forma como “o conhecimento nos é oferecido de bandeja, e já excessivamente mastigado, que chega a nós já com duvidosa veracidade”.
Assume que a Filosofia pode ajudar na busca da verdade numa altura em que estamos perdidos entre a nossa inteligência e a artificial, “entre um tempo que já foi lento e agora é acelerado”.
O evento que segue a linha dos Festivais de Modena, de Ischia em Itália, vai ter lugar em Cascais, entre os dias 19 e 22 de junho.
Como surge a ideia de organizar o 1° festival de Filosofia em Portugal?
A ideia do festival já andava na minha cabeça há uns anos, contudo só agora consegui reunir as condições para o poder levar em diante. Penso que há uma lacuna deste tipo de iniciativas no nosso país e que já acontecem em muitos outros países, há muitos anos. São momentos em que as pessoas se reúnem para pensar, ou pelo menos dar importância ao treino do pensamento como sendo uma necessidade tão fundamental, como por exemplo o treino do corpo, a prática de uma arte ou ofício.
Treinar o pensamento é estar disponível para pensar sem medo e também para ouvir outros pensarem. Esta nossa tão conhecida faculdade de pensar pode estar em crise por vários fatores, assim numa primeira e superficial abordagem, pela forma como o conhecimento nos é oferecido, de bandeja e já excessivamente mastigado, tão mastigado que chega a nós já com duvidosa veracidade.

A procura da verdade é uma das grandes buscas da Filosofia, penso que neste momento da história da humanidade a Filosofia pode ajudar-nos nessa busca, agora mais requintada de tão perdidos que estamos entre a nossa inteligência e a artificial, entre um tempo que já foi lento e agora é acelerado.
Quando e onde se vai realizar?
O festival vai realizar-se em Cascais, entre os dias 19 e 22 de junho deste ano. No dia 19 as sessões ocorrerão em dois bairros sociais, no dia 20 teremos uma sessão em mais um bairro social e um jantar oficial de abertura ( In vino veritas); no dia 21 as atividades do festival acontecem todo o dia na Casa das Histórias Paula Rego e, no dia 22, no Parque Marechal Carmona.
É inspirado em algum evento internacional?
Não diria inspirado, pois não pretendemos reproduzir o que se faz exatamente noutros lugares, mas posso dizer que os Festivais de Modena, de Ischia que se fazem em Itália, me levaram a pensar que no nosso país também poderia acontecer um evento onde a Filosofia fosse relevante.

Quais são os temas que preocupam a filosofia em 2025?
Em 2025 o tema do festival será O MEDO. O medo tem um papel determinante na vida do Homem. Tão depressa nos põe a pensar, como nos paralisa.
Esta tensão é tão característica e comum aos seres humanos que debatê-la e procurar uma abordagem filosófica no sentido de viver com o medo sem que este comprometa o pensamento ou nos aprisione em lugares onde pensar de forma livre e independente é ofensivo ou até criminoso.
Faz sentido termos espaços de encontro para pensar a filosofia?
Faz cada vez mais sentido ter espaços para pensar. Pensar a filosofia já é uma meta questão, tal como a de saber o que é um filósofo. Penso que a Filosofia pode e deve juntar-se de forma clara ao mundo atual onde as coisas acontecem para ajudar na sua compreensão, quer por via da sua vertente mais académia e teórica, quer pela via mais prática, a da Filosofia como modo de vida, muito em voga na antiguidade clássica. Sócrates não escreveu uma linha, mas viveu a Filosofia como modo de vida.
Todos podemos, no limite, ser filósofos, desde que sejamos absolutamente honestos com o que significa o pensamento, com a importância de perguntarmos e conhecermos os assuntos de forma mais profunda. Navegar à superfície não é o objetivo da Filosofia e, por isso, um mundo superficial, como abordagens e pessoas que se ficam pela primeira camada, não é um mundo que faça jus ao pensamento, nem ao ser humano enquanto ser vivo pensante, característica que enobrece a nossa passagem por esta vida neste planeta.
A filosofia pode explicar o sentido da vida?
As questões do sentido são amplamente estudadas pela Filosofia, as respostas sobre o sentido não são taxativas, ou definitivas, mas são portas que se abrem e por onde muitos de nós podemos entrar. Assim queiramos, sem medo de pensar.