A leitura, o grande diálogo da cultura humana, ocupa um lugar insubstituível na memória da humanidade. O diálogo com os livros e com os outros leitores potencia a experiência da leitura: abre horizontes, evita desencantos e otimiza o nosso tempo para ler, que é sempre pouco.
No princípio era a palavra oral, a humanidade retinha os saberes na memória e transmitia-os às gerações mais novas.
Mais tarde, inventou-se a escrita e os saberes de então passaram a ser gravados por palavras que iriam permanecer no tempo e no espaço. Surgiram os códigos que compilavam os costumes e as leis, os relatos dos acontecimentos em que se tinha forjado a história de cada povo e também as frases ou aforismos dos primeiros sábios.
Ao longo de mais de trinta séculos, desde o seu nascimento, os registos escritos foram evoluindo através de muitas e variadas formas: “livros de fumo, de pedra, de argila, de papiro, de seda, de pele, de árvore, de plástico e, agora, de plástico e luz”.
Irene Vallejo no seu livro “ O Infinito num Junco”, descreve de forma admirável esta epopeia ou aventura colectiva, protagonizada por milhares de personagens que, ao longo do tempo, tornaram o livro possível e o ajudaram a transformar-se, a evoluir e a ser um objecto do qual já não podemos prescindir.
Ler, como escutar, é um valor essencial para alargar os nossos horizontes, para amadurecer as nossas perspetivas, para compreender a complexidade e, ao mesmo tempo, a simplicidade do real.
Ler para crescer, sem se afogar na maré dos livros. Legere significa, originalmente, recolher, reunir. Ser verdadeiramente capaz de ler é mais do que saber dar voz às palavras, é ser capaz de interiorizar, de habitar as ideias dentro de si mesmo, de ler nas situações e nas pessoas.
O grande diálogo da cultura humana nutre-se destas aptidões, por isso a leitura ocupa um lugar insubstituível na memória da humanidade.
Non legere, sed eligere, (não ler por ler, mas saber escolher), implica saber defender um tempo útil para uma leitura adequada.
Se não dispomos de muito tempo livre, vale a pena escolher cuidadosamente o que se lê, sem nos deixarmos levar pelas aparências ou publicidades.
Como dizia Charles Dickens, «Há livros dos quais as lombadas e as capas são, com pouca diferença, o melhor».
O diálogo com os livros e com os outros leitores potencia a experiência da leitura: abre horizontes, evita desencantos e otimiza o nosso tempo para ler, que é sempre pouco.
Embora nem todos os livros marquem um antes e um depois na nossa vida, o que lemos muda-nos, abre-nos horizontes ou estreita-os. À medida que o tempo passa, a nossa personalidade reflete os livros que tenhamos lido e também aqueles que não lemos.
Quem, ao longo dos anos, se nutre de leituras selecionadas com bom critério, adquire um olhar aberto sobre o mundo e as pessoas, sabe medir-se com a complexidade das coisas e desenvolve a sensibilidade necessária para deixar de lado a banalidade e não passar ao largo diante da grandeza.
Falar do que se lê enriquece a vida familiar e as conversas com amigos, que por vezes acabarão por tomar a forma de tertúlias literárias ou outras actividades culturais, como as que estendem pontes entre a literatura e o cinema. E se as boas leituras se transmitem muito eficazmente de boca em boca, também é útil organizar clubes de leitura, frequentar boas livrarias, manter o contacto com livreiros e estabelecer com eles um diálogo frequente, que costuma enriquecer ambas as partes.
Importa também ler com capacidade crítica – do grego krinein – que significa originariamente discernir, escolher supõe extrair o melhor de cada livro.
Os autores, tal como nós, estão condicionados pelo seu contexto e cultura. Por isso quando lemos é bom interrogarmo-nos, por exemplo: porque se expressa o autor deste modo? Quais são os ideais da sua época e o que pretende projectar nas suas personagens? Qual é a sua percepção dos valores perenes, como a amizade, o perdão, a lealdade, etc.?
Importa descobrir as luzes e sombras de cada obra, clarificar algumas ideias ou propostas, participando num diálogo interior com o livro, numa leitura activa e construtiva.
Um bom leitor costuma ser também um re-leitor: alguém que volta a ler obras que um dia o marcaram. Um modo eficaz de o fazer é tomar algumas notas, que nos permitam voltar ao cantinho do nosso interior que se iluminou com uma determinada leitura.
A abertura da alma, a amplitude de horizontes, são autênticos quando vibram com a procura e o encontro, de uma boa história, que serenamente nos prenda e apaixone, porque se há livros que nos marcam, há, seguramente, outros que mudam a nossa vida.


