É lamentável, porque é no mínimo suspeito que tantos agentes das mesmas unidades – ao ponto de a PSP não ter conseguido arranjar substitutos – tenham ficado súbita e simultaneamente doentes sem qualquer facto conhecido que o explique, pelo que muito bem andou o Ministro da Administração Interna quando ordenou a investigação da situação, para apuramento de eventuais responsabilidades criminais e/ou disciplinares.
É indiscutível que a PSP e a GNR têm razão nos seus protestos. E não tanto por causa da diferença de tratamento quanto ao suplemento de missão atribuído à PJ, relativamente ao qual se sentem discriminadas, mas sobretudo porque já há muitos anos que têm vindo a reclamar, com toda a justiça, contra as más condições em que os seus efectivos são obrigados a trabalhar, com baixas remunerações, bem como falta de meios humanos e materiais.
É igualmente inequívoco que Portugal muito deve às suas forças de segurança. Não obstante a maledicência e a descrença que os portugueses muitas vezes têm quanto ao nosso próprio país, a verdade é que as elevadas posições que Portugal ocupa em termos de rankings de segurança, comparativamente com outros países incluindo os mais desenvolvidos, não se devem apenas aos nossos «brandos costumes», mas também, e muito, ao elevado profissionalismo, dedicação e eficácia das nossas forças de segurança, incluindo a GNR e a PSP.
Os protestos que têm sido feitos pelos agentes da PSP e pelos militares da GNR têm sido visíveis, constantes, e levados a cabo com respeito pela dignidade e disciplina destas forças de segurança, o que é de louvar e de assinalar.
É por isso muito lamentável que o Estado se tenha furtado, durante tanto tampo, a dar resposta às necessidades de vencimentos e meios das forças de segurança, nomeadamente da PSP e da GNR.
Mas também é profundamente lamentável o que sucedeu recentemente, com o cancelamento do jogo de futebol entre Famalicão e Sporting, por força da alegada incapacidade da PSP de garantir o policiamento do evento, por força de um elevado número de agentes que terão, simultaneamente, faltado ao serviço invocando doença.
É lamentável, porque é no mínimo suspeito que tantos agentes das mesmas unidades – ao ponto de a PSP não ter conseguido arranjar substitutos – tenham ficado súbita e simultaneamente doentes sem qualquer facto conhecido que o explique, pelo que muito bem andou o Ministro da Administração Interna quando ordenou a investigação da situação, para apuramento de eventuais responsabilidades criminais e/ou disciplinares.
Mas sobretudo, é intolerável que se tenha sequer colocado a hipótese de não ser possível realizar as eleições legislativas previstas para 10 de Maio, por força de uma eventual futura situação similar. Isso seria um ataque directo ao coração do funcionamento do Estado Democrático, a todos os títulos inadmissível, e certamente contraproducente para as forças de segurança e para as suas legítimas aspirações. Mais do que isso, seria indigno das nossas forças de segurança, e de tudo quanto acima de se disse delas, do seu papel, e do seu desempenho. Demonstraria, ainda, uma absoluta incapacidade de reacção do Estado, o que seria igualmente inaceitável. Não é, por isso, um cenário sequer equacionável (o que não quer dizer que não se devam tomar medidas preventivas relativamente ao mesmo).
Uma última nota para dizer que, se sempre se soube que, na sociedade portuguesa em geral, os atestados médicos «de favor» são por vezes utilizados para justificar uma qualquer falta pontual, e nunca são questionados, a verdade é que, com o novo sistema que permite aos cidadãos obter online e sem escrutínio de um médico uma declaração de baixa por doença até três dias, o recurso a este expediente ficou muito facilitado.
Desconheço se foi ou não esse o caso das faltas por doença invocadas pelos agentes faltosos no caso acima referido, mas o que é facto é que, em abstracto, este sistema permite facilmente o boicote ao trabalho, pelos funcionários de qualquer empresa privada ou entidade pública, de forma massiva, simultânea e organizada – e com a Segurança Social a pagar as baixas! Não devia ser necessário, mas pelos vistos, é preciso rever este mecanismo o mais brevemente possível.


