Nestes últimos dias, a democracia europeia respirou de alívio. Em duas eleições legislativas importantes no espaço europeu, Reino Unido e França, podemos afirmar, sem hesitação, que a tolerância e a solidariedade tiveram uma vitória. É preciso, no entanto, enquadrar este fôlego, por mais reconfortante que ele seja para quem defende os valores da república e da democracia.
É certo que este este momento é um balão de oxigénio à cultura democrática europeia. O avanço do populismo na Europa, nomeadamente no Reino Unido e França, levou-nos a crer que a história de luta pela democracia na Europa, sobretudo nas gerações mais jovens, estava a ser desvalorizada e esquecida. As redes sociais, a falta de verificação da verdade e dos factos nos media, encheram-nos de preocupação quanto à capacidade de resistência dos valores humanistas no nosso espaço. Neste sentido, estes resultados eleitorais podem ser entendidos como um balão de esperança.
Considero que se deve fazer uma análise séria destas eleições, sobretudo sob o prisma dos jovens. Não será importante saber até que ponto os jovens europeus quererão, de facto, um retrocesso em matéria de direitos humanos e tolerância, ou em questões como o aborto, a eutanásia, e tantas outras?
Creio que talvez tenhamos uma surpresa e nem só com os jovens. Temos atribuído o avanço do populismo à futilidade das novas tecnologias. Com isso, talvez tenhamos descurado o facto de que a sua maior arma, nomeadamente a da extrema-direita, historicamente, tem sido a capacidade de orquestrar a voz do protesto. Atualmente, as redes e seus derivados são apenas o meio, nunca a estratégia e é útil que tenhamos consciência disso.
Talvez tenhamos de encarar de modo diferente a maneira como a democracia é apresentada aos cidadãos e talvez até explicá-la com mais humildade. Temos de lutar por instituições democráticas cada vez mais amigas e próximas de todos. Em última análise, parece, cada vez mais, que é mesmo a desilusão dos europeus com elas que descredibilizam a democracia.
A exposição “A Nós a Liberdade” – Vieira da Silva, patente atualmente na Assembleia da República e que visitei recentemente, mostra precisamente o quanto estas lutas são antigas. Podia também falar do filme “À nous la liberté”, de René Clair, de 1931, ou do “Modern Times”, de Chaplin. Todavia, o que quero mesmo dizer é que estou muito feliz porque, nestas eleições, senti que algo ficou, por pouco que seja, da liberdade, da igualdade e da fraternidade com que a Europa tem crescido.
É claro que isto tem de ser mais do que um balão de esperança, como afirmei, por muito aconchegante que ele seja. Vamos, pelo menos, entendê-lo como um rumo que nos apontam.