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World Kindness Day

Susana Mexia

A reflexão sobre Bondade, Ética, Moral e Dever conduziram-me ao inevitável flagelo dos nossos dias, chamado “bullying”, um problema generalizado que afecta indivíduos de todas as idades e pode assumir muitas formas, incluindo bullying físico, verbal e cibernético.

O Dia Mundial da Bondade celebrado a 13 de Novembro, World Kindness Day, procura reavivar e recordar ao mundo como é importante ser gentil, dizer um simples obrigado, fazer um belo sorriso, um gesto carinhoso ou outras pequenas acções que podem fazer toda a diferença. Mas a Bondade implica também ser boa pessoa, altruísta e generosa.

A iniciativa desta efeméride nasceu no Japão com um Pequeno Movimento de Bondade fundado em 1988, em Tóquio. Mais tarde, uma coligação de ONGs com objetivos semelhantes levou-o a vários países e em 1997, quando várias organizações de bondade de todo o mundo se reuniram numa conferência e tornaram oficial o Dia Mundial da Bondade que hoje já se celebra em muitos países.

Recordemos que Bondade é a qualidade correspondente a ser bom (bondoso), ou seja, a qualidade de manifestar satisfatoriamente alguma perfeição, ter ou fazer bem, que se pode aplicar a pessoas, coisas e situações.

No comportamento humano, é um atributo marcado por características éticas, uma disposição agradável, uma preocupação e consideração pelos outros; a disposição permanente de uma pessoa em fazer o bem, neste sentido, tem por sinónimo a benevolência, expressada também como gentileza e amabilidade.

A Bondade, considerada uma virtude, é reconhecida como um valor em muitas culturas e em todas as ancestrais religiões do Oriente – Hinduísmo, Budismo e Confucionismo entre outras, sendo ainda considerada uma das grandes virtudes no Cristianismo, cujas passagens do Evangelho nos revelam a Bondade de Deus através dos ensinamentos de Jesus Cristo, pondo sempre a tónica na prática do bem, em amar os inimigos, em perdoar e não voltar a pecar.

Paralelamente temos a Filosofia, na qual é exaltada a Soberania do Bem como ponto de referência ou ideal máximo a atingir pela espécie humana.

Platão considera que para se efectivar a Bondade, se deveria contemplar o modelo ou paradigma da “Ideia de Bem” e dela participar, segundo a sua Teoria das Ideias ou Teoria das Formas. O seu discípulo Aristóteles, no livro II de Retórica, define bondade como a ajuda a alguém necessitado, não em troca de nada, nem da vantagem do próprio ajudante, mas em prol da pessoa ajudada. Na sua Ética a Nicómaco, Aristóteles reitera que “a vida do homem é a actividade da alma que implica um princípio racional, sendo sua característica o nobre desempenho de todas as actividades, quando são bem executadas e realizadas de acordo com a excelência adequada. Assim, o bem humano passa a ser a actividade da alma de acordo com a virtude, e, se houver mais de uma virtude, de acordo com a melhor e mais completa”.

Deambulando num périplo de boas acções ou Bondade, desde as religiões até aos pensadores, ocorreu-me o modelo ético que Immanuel Kant (1724-1804) criou, querendo que o mesmo fosse independente de qualquer tipo de justificação moral religiosa e se baseasse apenas na capacidade de julgar inerente ao próprio ser humano. Surgiu assim o “Imperativo Categórico”, uma ordem que o indivíduo pudesse utilizar como uma bússola moral. Esse imperativo é uma lei moral interior ao indivíduo, baseada apenas na razão humana e não possui nenhuma ligação com causas sobrenaturais, supersticiosas ou relacionadas a uma autoridade do Estado ou religiosa. (Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785).

O filósofo buscou estabelecer uma fórmula moral para a resolução das questões relativas à acção. O Imperativo Categórico, ao longo das obras de Kant, aparece formulado de três maneiras diferentes.

Cada uma das três formulações se complementam e formam o eixo central da moral kantiana. Nela, as ações devem ser orientadas pela razão, sempre saindo do particular, da ação individual, para o universal da lei moral:

1. Age como se a máxima de tua acção devesse ser erigida por tua vontade em lei universal da Natureza.

2. Age de tal maneira que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de outrem, sempre como um fim e nunca como um meio.

Nessa segunda formulação, Kant reforça a ideia de que a humanidade deve ser sempre o objetivo da ética. Todas as ações devem estar subordinadas ao respeito por si próprio e à humanidade.

Deste modo, um ser humano jamais pode ser usado como um instrumento para se alcançar qualquer tipo de objetivos. A humanidade é o fim das acções e nunca um meio. Kant contraria a ideia de que “os fins justificam os meios” ou qualquer visão utilitária da ética.

3. Age como se a máxima de tua acção devesse servir de lei universal para todos os seres racionais.

Ao contrário da Natureza que age determinada pelas causas, os seres racionais determinam a sua vontade de acordo com os fins.

O agente deve tomar como princípio a ideia de que sua acção possa servir como lei para todas as pessoas. Ou seja, com base na razão, a boa acção é a que está em conformidade com o dever.

Para Kant, a vontade boa é aquela que quer aquilo que deve. Ou seja, a boa vontade orientada pela razão está de acordo com o dever e quer o bem.

A Razão compreende o que é o dever e o ser humano pode escolher agir de acordo com esse dever ou não. Entretanto, a acção moral será sempre a acção por dever.

A reflexão sobre Bondade, Ética, Moral e Dever conduziram-me ao inevitável flagelo dos nossos dias, chamado “bullying”, um problema generalizado que afecta indivíduos de todas as idades e pode assumir muitas formas, incluindo bullying físico, verbal e cibernético.

O dia 20 de outubro é dedicado, em todo mundo, ao tema do “bullyng”, expressão inglesa para caracterizar práticas de agressões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira repetitiva, por um ou mais alunos contra um ou mais colegas, especialmente no ambiente escolar.

Consciencializar a população mundial para esta forma de violência, apoiar e incentivar as vítimas a denunciarem estas graves situações e encontrar formas de as prevenir, são os desafios colocados por esta data, visto que a luta contra o bullying não é uma tarefa de um dia, nem de um grupo de pessoas, mas sim de todos os dias do ano e de todas as pessoas. É também um acto de Bondade, um Dever moral e uma responsabilidade Ética que assiste a todos nós como cidadãos.

Naturalmente a família e a escola são as estruturas mais importantes na prevenção e no combate à violência praticada contra crianças e jovens no âmbito deste flagelo.

Enquanto os pais podem ajudar uma criança a desenvolver controle e regulação emocional para restringir o comportamento agressivo, algumas crianças não conseguem desenvolver essas habilidades devido ao vínculo inseguro com suas famílias, a uma disciplina ineficaz e a factores ambientais, como uma vida doméstica stressante e ambiente hostil.

Estudos mostram que a inveja e o ressentimento podem ser motivos para o bullying. Enquanto alguns agressores são arrogantes e narcisistas outros podem usar o bullying como uma ferramenta para esconder vergonha ou ansiedade ou para aumentar a própria autoestima e ao humilhar os outros, o agressor sente-se mais fortalecido. Os agressores podem intimidar por inveja ou porque eles próprios se sentem intimidados. O bullying também pode resultar de uma predisposição genética ou de uma anormalidade cerebral do agressor.

De acordo com alguns investigadores, os agressores podem estar inclinados para a negatividade, e terem um desempenho académico fraco. Normalmente, têm atitudes e crenças negativas sobre os outros e baixa autoestima em relação a si próprio, vêm de um ambiente familiar caracterizado por conflitos com os pais, vendo a escola e os colegas como elementos de agressividade.

É importante abordar o bullying desde o início, pois pode ser mais fácil controlá-lo. Todos podemos desempenhar um papel importante no controle do bullying, pequenos passos, abordagens subtis, onde se conjuguem a Bondade, o Amor, a Justiça, a Sabedoria e o Perdão, recorrer a palavras edificantes, sermos pacificadores, cuidando das necessidades dos outros.

O bullying é um problema mundial, sendo que a agressão física ou moral repetitiva deixa sequelas psicológicas na pessoa atingida e desrespeitam os princípios dignidade da pessoa humana. Aqui há que exaltar a virtude da prática das boas acções tão ao sabor dos primeiros filósofos, nomeadamente Aristóteles.

Como cristãos, somos chamados a responder a esses desafios, recorrendo aos ensinamentos de Jesus Cristo e aos princípios encontrados na Bíblia, não com ódio ou vingança, mas com um espírito de compaixão e perdão.

Como cidadãos recordemos o Dia Mundial da Bondade com o qual iniciámos este texto.

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