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Duarte de Lima Mayer: “O Tivoli foi marcante para o simbolismo da Avenida da Liberdade como a artéria nobre da cidade”

Marta Roque

Nos 100 anos de história o Tivoli foi exclusivamente privado, fundado por Frederico de Lima Mayer que ambicionava um “Palácio do Cinema” na Avenida da Liberdade, à semelhança do que havia já noutras cidades da Europa. A construção e gestão foi sempre privada, não tendo apoios públicos, “nem mesmo quando se tornou um edifício classificado”, conta Duarte de Lima Mayer ao Estado com Arte Magazine.

Durante cinco décadas, os anos em que a família Lima Mayer geriu a sala de espectáculos da Avenida da Liberdade, foi um dos grandes centros culturais da cidade de Lisboa. Atraindo à capital os grandes nomes da Música, do Teatro, do Ballet e da Dança, e importante salão de chá e de baile.

O “boulevard da Avenida da Liberdade” acompanhou a vida da história do Cinema, desde o cinema mudo até ao cinema sonoro. As salas e fachadas foram restauradas em 2o12, hoje  o Tivoli está dedicado em especial ao teatro.

Frederico de Lima Mayer, amigo do arquitecto Raul Lino encomenda o projecto do Tivoli, inaugurado em 1924. A família Lima Mayer era a proprietária dos terrenos naquela que veio a ser a Avenida da Liberdade ( 1879). “Quando o Passeio Público foi substituído pela Avenida da Liberdade, houve terrenos que foram expropriados.” conta Duarte Lima Mayer, descente da família fundadora e proprietária do Tivoli até 1973.

Em duas fachas laterais dos terrenos na Avenida da liberdade vieram a ser construídos: uma casa que acabou por ser o primeiro Prémio Valmor (1901), actual Consulado Geral de Espanha; e um parque, que mais tarde deu origem ao nome Parque Mayer.

Na outra faixa, a família foi obrigada também a construir. Como havia a referida casa do outro lado, lembrou-se Frederico de Lima Mayer de fazer um “Palácio do Cinema” à semelhança do que havia já noutras cidades da Europa, comenta Duarte de Lima Mayer, advogado.

“O Tivoli foi marcante para o simbolismo da Avenida da Liberdade como a artéria nobre da cidade, desviando as actividades culturais que estavam até aí concentradas sobretudo no Chiado. A Avenida da Liberdade paulatinamente assumiu-se como a grande boulevard da cidade”, diz o advogado de imobiliário ao Estado com Arte Magazine.

O Cinema Tivoli, tão importante no panorama sócio-cultural de Lisboa, foi a primeira e mais constante elegante sala de Lisboa feita propositadamente para o Cinema, procurando exibir espectáculos de grande qualidade artística.

Se o cinema, desde a sua criação em 1924, ainda como Cinema Mudo, acompanhado de orquestra de cordas, foi o que mais habitualmente terá sido esta sala polivalente, a Música, o Teatro e a Dança que aí também se apresentaram trouxeram a Lisboa grandes referências internacionais.

A lista no campo da música é extensa e abarca nomes notáveis como Stravinsky, os grandes violinistas Szigeti, Heifetz, Menuhin, Oistrak e pianistas como Rubinstein ou Richter, sem esquecer grandes orquestras e famosos maestros Bohm, Von Karajan.

O Tivoli não era apenas uma sala de espectáculos, na mesma lógica de uma atmosfera de bem receber, na linha de dos salões de tradição europeia, consistia em amplos espaços de convívio e um salão de chá que também se transformava em alguns momentos em salão de baile.

O teatro – desde a iniciativa vanguardista do «Teatro Novo» de António Ferro, mas também trazendo as melhores companhias francesas e inglesas e outras, e a dança com Alicia Markova, Béjart, Merce Cunningham, e muitos mais – não ficaram atrás.
Agente cultural de peso formando gerações, basta relembrar os concertos da Juventude Musical Portuguesa ou as chamadas «Terças-Feiras Clássicas», o Tivoli colaborou activamente com a Sociedade de Concertos de Lisboa com Pedro de Freitas Branco e a Marquesa de Cadaval organizando, antes da inauguração da sua sede, perto de 100 concertos da então recentemente criada orquestra e coro Gulbenkian. É neste contexto que nasce o Concurso Internacional Vianna da Motta.

Frederico de Lima Mayer, fundador do Cinema Tivoli na Avenida da Liberdade

 

Frederico de Lima Mayer empresário português apaixonado pelas artes e botânica, ofereceu à cidade de Lisboa um espaço exclusivamente dedicado ao culto da Sétima Arte, que homenageia as suas quatro filhas através do bouquet com quatro rosas que compõem o símbolo do cine-teatro localizado na Avenida da Liberdade. Para a estreia, o glamoroso teatro lisboeta exibiu o filme ‘Violetas Imperiais’, de Henri Roussell e Raquel Meller.

Por aqui passaram e deram os primeiros passos, grandes vultos da música portuguesa. É tal a rica história do Tivoli, que se pode dizer ter sido um verdadeiro «centro cultural.»

 

Origens do Tivoli

 

O livro Cinema Tivoli, os anos Lima Mayer, editado pela Building Ideas ( 2016 ) é assumidamente uma forma de “salvar do esquecimento o património inestimável que revela a ação teimosa e esclarecida do seu avó, Augusto de Lima Mayer, à frente da instituição.” Dedicado ao Cinema Tivoli, local de fortíssima carga afectiva para múltiplas gerações de lisboetas e que comemora 100 anos de existência em 2024.

Esta obra abarca cinco décadas, os anos em que a família Lima Mayer geriu esta sala de espectáculos da Avenida da Liberdade e que foi, sob a direcção de Frederico de Lima Mayer e depois de Augusto, seu filho, um dos grandes centros culturais da cidade de Lisboa atraindo à nossa cidade durante mais de cinquenta anos os grandes nomes da Música, do Teatro, do Ballet e da Dança, além de acompanhar toda a vida da história do Cinema, desde o cinema mudo até ao cinema sonoro.

Filho de empresário bem sucedido, Frederico de Lima Mayer aproveita terrenos da família que tinham sobrado de expropriações do século XIX para a construção da Avenida da Liberdade, o novo boulevard de Lisboa.

No final da II Guerra Mundial, em 1944, Augusto de Lima Mayer, um dos filhos de Frederico assume a gestão do Tivoli. Propõe aos irmãos, com quem partilha a Sociedade Filarmónica do Tivoli, que não lhe paguem salário, mas que as viagens a Londres e a Paris, para a escolha da programação, sejam por conta do seu trabalho de gestão.

O Tivoli é vendido em 1973 à Lusomundo de João Ildefonso Bordalo, que utiliza como sala-bandeira da distribuidora.

Do Passeio Público à avenida

 

A demolição do Passeio público começou em 1879, apesar dos protestos de cidadãos que chegaram a pedir a assinar petições, entre eles Ramalho Ortigão.

O Presidente da Câmara Rosa Araújo foi inamovível quanto à demolição, por isso a abertura da Avenida principia uma campanha de urbanização sem precedentes nas pendentes laterais a Valverde, ocupando quintas, hortas e ruínas.

O rompimento do velho passeio publico pombalino a partir de 1879, transformando-o no eixo de crescimento da cidade para o interior, é um momento charneira da história da cidade.

Aliado ao carácter de modificação estrutural da malha urbana de Lisboa, a manifesta influência do modelo do boulevard parisiense, com especial referência aos campos Elísios napoleónicos marca a vontade portuguesa de Progresso, personificada na figura do presidente da câmara, Rosa Araújo.

“O que é interessante na história do Tivoli é que o Tivoli foi sempre, nos seus 100 anos, exclusivamente privado. Na construção e na sua gestão foi sempre privada, não tendo apoios públicos, nem sequer quando se tornou um edifício classificado.”

Em 2012, por iniciativa privada, foi iniciado um plano de ação de intervenção no Tivoli visando a conservação e valorização do enorme valor patrimonial do edifício, a modernização como sala de espetáculos, orientada sobretudo para o teatro.

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