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Crónica. Amor precisa-se

Maria Helena Paes, Escritora

E chegou o almejado momento de regressar. Não que todas as situações ao meu redor se tivessem resolvido, mas foi o tempo suficiente para me reconciliar com a minha memória em relação a mim própria e aos acontecimentos. Tudo tem o seu tempo!

Sim, é verdade! O amor e o carinho revestem-se da maior importância na nossa vida. Ajudam-nos a enfrentar as tempestades que sempre vão surgindo. Mas nem sempre é assim! Às vezes, mesmo quando o Amor existe, há ventos que sopram muito fortes. Tão fortes que nos abalam ainda que não nos verguem.

Na nossa vida acontecem muitas coisas que nós não entendemos. Torna-se necessário, algumas vezes, reconciliarmo-nos com a nossa história. Veremos mais tarde como do mal Deus tirou o bem. Foi um pouco o que se passou comigo. Mais um desgosto, entre tantos outros, que de algum modo me esvaziou tornando-se necessário tentar concentrar todas as forças na busca de soluções para a nova situação. E tomei alguma distância. Um dia regressaria à escrita. O melhor mesmo era conceder-me, entretanto, uma “licença sabática”.

E chegou o almejado momento de regressar. Não que todas as situações ao meu redor se tivessem resolvido, mas foi o tempo suficiente para me reconciliar com a minha memória em relação a mim própria e aos acontecimentos. Tudo tem o seu tempo! Neste meu “retiro” temporal, Alguém permaneceu sempre ao meu lado, Jesus. E foi-me guiando pelos caminhos da vida, concedendo-me, ainda assim toda a liberdade. Procurava ao meu redor soluções que tardavam em surgir.

Ainda assim, mais tarde do que cedo, apercebi-me que não sou omnipotente, que não tenho o poder de resolver todos os problemas. Foi-me dado ver também que os outros têm perceções diferentes sobre o mesmo assunto. Não podemos mudar os outros, mas sim respeitar as suas decisões. E chega o momento de, depois de termos envidado todos os nossos esforços, de partirmos sem deixar contudo de acompanhar e apoiar quem precisa de nós.

A minha experiência revela que devemos seguir em frente, sob pena de nos perdermos no meio das situações existentes, concedendo espaço aos outros para que encontrem os seus próprios mecanismos de defesa, as suas soluções. Estas podem ser diferentes das nossas, ainda que nos custe muito e o nosso coração angustiado se refugie em Jesus pedindo-lhe que nos conceda a fortaleza necessária para aceitarmos. Temos de nos habituar a ver as coisas boas e, já agora, suportar com valentia os nossos desgostos.

Foi nesta circunstância que me apercebi como a escrita me alimenta. Sentia uma sensação de vazio, de que não retornaria a escrever. Pensava nos textos que ainda poderei publicar. Seriam lixo se eu não zelasse por eles. A vida mudou, os gostos mudaram, tanta coisa que já não é igual. Certamente há muitas coisas que agora são melhores, outras nem por isso. Mas este é o tempo em que vivo, certamente com um papel a desempenhar com todos os meus erros e qualidades, vivendo a vida como se fosse uma antecâmara do Céu.

Como é libertador saber que Jesus nos ama como somos, e que conta connosco. Alguém dizia que uma cara que irradia esperança tem sentido para a vida, que a pessoa que tem o coração cheio de amor e de alegria tem sempre esperança. A alegria é compatível com o sofrimento já que a alegria humana e sobrenatural têm as suas raízes em forma de cruz.

O amor é esquecer-se de si para se dar aos outros. Não desanimar perante as dificuldades. É mais feliz aquele que dá, do que quem recebe. O amor é esquecer-se de si para se dar aos outros. Tudo o que é belo e bonito vem de Deus. Tudo concorre para o bem. Somos chamados a ser semeadores de esperança e a procurar construir a paz. Pensei interiormente: “Que faço eu para ser feliz?”

Imbuída nestes pensamentos resolvi fazer uma tarde de cinema. Uma amiga tinha-me recomendado o filme biográfico denominado “Uma Vida Singular”, de Nicholas Winton. Uma história extraordinária passada na época de Hitler antes do início da II Guerra Mundial. Mas que belo filme! Apesar de sair com lágrimas ao canto do olho, estava de coração cheio, ainda que fosse passado em contexto de guerra e com crianças judias que viviam num ambiente de grande carência e, em elevado risco de irem parar a um campo de concentração se a cidade de Praga fosse invadida, como mais tarde viria a acontecer.

Foi muito bom ver que há pessoas que se unem por defender uma causa nobre, no sentido de salvar as crianças de uma morte pré anunciada, muitas vezes pondo em risco a sua própria segurança. Esta operação ficou conhecida como Kindertransport. Tardei algum tempo em recuperar, em descer à realidade. Como me tocou este filme impressionante! Que demonstração admirável de amor pelas crianças.

Termino com palavras do Papa na sua carta para o IV Domingo da Páscoa, Domingo do Bom Pastor, de 21 de Abril de 2024: “…o nosso caminho sobre esta terra nunca se reduz a uma labuta sem objetivo nem a um vaguear sem meta; pelo contrário, cada dia, respondendo à nossa chamada, procuramos realizar os passos possíveis rumo a um mundo novo, onde se viva em paz, na justiça e no amor. Somos peregrinos de esperança porque tendemos para um futuro melhor e empenharmo-nos na sua construção ao longo do caminho…, apaixonemo-nos pela vida e comprometamo-nos no cuidado amoroso daqueles que vivem ao nosso lado e do ambiente em que habitamos…levantemo-nos, pois, e ponhamo-nos a caminho como peregrinos de esperança, para que nós, como fez Maria com Santa Isabel, possamos comunicar boas-novas, gerar vida nova e ser artesãos de fraternidade e de paz”.

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