MAGAZINE

Inês Baptista. “Nem todos nos podemos dar ao luxo de ter só arte sem ser útil”

Marta Roque

Inês Baptista, pintora de estilo clássico de porcelana, introduziu em Portugal os troféus com animais bovinos, ovinos, caça (cães e cavalos). Uma fusão de um utilitário e a arte. Considera o utilitário de pratos pintados de “fascinante”, ou seja “a possibilidade de ter algo artístico que todos os dias podemos usar.”

Percorre o circuito de troféus de feiras agrícolas em Portugal e em Espanha. A formação em Engenharia Zootécnica deu-lhe o know-how para produzir algo único no mercado da Arte.

É pintora dos troféus que vão ser entregues nos concursos pecuários da Feira da Luz, Montemor-o-Novo, o maior evento de pecuária extensiva do pais, no próximo dia 31 de agosto.

Inês Baptista pinta animais em pratos e peças de porcelana, artista de pintura  a óleo descobriu que havia uma lacuna de arte em Portugal: na sala de jantar não existia este tipo de representação artística com animais nos serviços de mesa clássicos.

Descende de uma família em Montoito, no Alentejo, é aqui que tem o seu atelier de pintura Ateliero2, onde pinta à mão porcelana fina, azulejo e óleo sobre tela. Deixou a sua carreira na área farmacêutica para se dedicar à pintura.

A sua formação base é em Engenharia Zootécnica, que a seu ver implica que os animais estejam bem tratados, é esse o conceito máximo da zootécnia que defende, independentemente do conceito produtivo. “Foi uma coisa que me fazia sentido: que se maximizasse ao máximo o bem estar dos animais, extensível a qualquer que seja a relação com eles, produtiva ou companhia.

Passagem da Zootécnica para Pintura

A pintura sempre existiu na vida de Inês, mas se apenas tivesse seguido a pintura teria sido redutor, assegura. “Se eu fosse apenas estudar pintura nunca saberia o que sei sobre animais.”

A avó e a tia pintavam, para Inês se diferenciar numa família de pintores decidiu estudar os animais, “sentia que ninguém lhe ligava”, foi uma maneira de se levar “mais a sério”.

Em família de Pintores: quem sai aos seus… a tia-avó pintava, Francisca Baptista, deu-lhe formação; mais tarde teve aulas com uma pintora em Évora, Teolinda Pascoal, artista em azulejaria da Faculdade de Belas Artes de Lisboa.

Inês desenvolveu formação auto-didata, escolheu formação em óleo e desenho com pintores da escola italiana clássica, para além de estar em constante formação de workshops, mas acima de tudo aprende “a ir fazendo”.

Serviços de loiça em alternativa ao barro

Inês sentiu que fazia falta a porcelana, porque o barro e faiança já eram muito comuns na cultura portuguesa, e “mais grosseiros ao toque”.

“No mundo em que vivemos nem todos nos podemos dar ao luxo de ter só arte sem ser útil. Aqui pensei que era importante juntar nos animais nesta equação,” conta a artista.

Começou nos concursos de pecuária a pedido de proposta de José Romão, criador de ovinos ile de France e P3 , que queria que pintasse ovelhas vermelhas em pratos, como troféus. Inês confessa que tinha de conhecer morfologicamente os animais para os representar, o seu resultado artístico começou a ser “apetecível” para o mercado o sector agro-pecuária.

Há uma “dureza” de trabalho na vida do campo, “implacável” em todos os dias do ano, acredita que “é muito bom ter uma porcelana, algo com cotação, de pintura igualmente trabalhosa, para premiar estes agricultores que merecem.”

Executa em pintura de porcelana inspirada, sobretudo, em Sévres e em outras fabricas europeias de porcelana (a fusão do utilitário e algo com técnica e criativa), além dos troféus os serviços de mesa personalizados são outro ponto forte do atelier.

Troféus da Expomor

Há 5 anos a Apormor, Associação de Produtores Bovinos, Ovinos Caprinos de Montemor-o-Novo, começou a encomendar troféus ao atelier de Inês Baptista por ocasião da Feira de Montemor – Expomor que acontece no final de agosto todos os anos.

Para a produção de uma encomenda existe todo um processo de preparação da pintura de um animal: há uma entrega de listagem com os prémios que vão a concurso.

“É importante ter uma noção dos prémios”, explica Inês, “preciso de perceber as classes a concurso , porque um touro de 7 anos tem diferença de um bezerro de 9 meses, ou um grupo de criador. Há dados que por formação consegue representar.” Os troféus da Expomor foram bem recebidos pelos criadores, já existe um reconhecimento deste trabalho de Inês Baptista.

A artista admite que continua a crescer nesta sua arte, “tenho de fazer melhor para não desiludir. E o facto de ter conhecimentos na área animal ajuda”.

Produz troféus em porcelana para Feiras em Espanha

Trabalha regularmente para a associação de criadores de ovinos precoces espanhola – A.E.C.O.P , sobretudo na Extremadura e Andaluzia, faz os troféus para a conhecida feira de Zafra.

Na área da canicultura faz alguns concursos pontualmente em Portugal, exposição canina nacional do alto Alentejo; a Monografica dos border collie, Rafeiro do Alentejo , cão da serra de aires, entre outros.

“Tem de haver uma certa paixão. Temos de estar envolvidos no processo. Não é fácil ir buscar 90 exemplares diferentes para que cada trofeu seja único”.

Com a pintora trabalham o seu filho Eduardo e Ana, que trouxeram ao atelier mais capacidade de resposta , mas com igual ou ate superior qualidade, uma opção contemporânea destes dois jovens pela pintura clássica.

A quem a Inês explica o perfil dos animais para uma boa representação da pintura. “Por vezes a foto não demonstra bem o animal. Para que o troféu seja troféu, e não um qualquer exemplar desfasado.”

Considera que a pintura a óleo em tela é “a mãe de toda a pintura, embora o que torna o utilitário dos pratos fascinante, seja a possibilidade de ter algo todos os dias que podemos usar.”

Mas gosta muito da pintura em tela, à qual volta de vez em quando, devido às encomendas.

A porcelana funciona com diferentes óleos, desde óleo de alfazema, serigráfico, e outros dependente do tipo de secagem que se quer otimizar. Compra a porcelana, mas a cozedura e mistura das tintas faz tudo no seu atelier.

O Azulejo também faz parte dos trabalhos do atelier, apesar de não ser a sua área de eleição, conta com a colaboração do filho Eduardo e Ana, os dois com licenciatura em Belas Artes em Lisboa, fazem este trabalho.

“Não podemos mudar de técnica e tema a toda a hora. Temos de ter bom conhecimento clássica e focarmo-nos cada um nas suas vocações maiores, pontualmente consoante os temas que cada um pinta e é mais forte,“ conta.

As encomendas de azulejo e de serviços de mesa são de particulares, na sua maioria clientes ligados à área dos animais, e com muita frequência de outros países.

Testemunho de vida

Inês teve um diagnóstico cancro, passou por um momento mais exigente da sua vida com o problema de saúde, diz que uma das coisas que considera essenciais é que “há um enorme falta de noção do sofrimento alheio”.

“As pessoas centram-se muito nelas próprias. Há vidas duríssimas, pessoas que criam filhos com muitas dificuldades, têm problemas de saúde, que as vezes não mediáticos, mas são muito limitadores.

Quando se depara com uma neoplasia deve-se perceber que há muito tratamento e muita esperança, mesmo não sendo todo o prognostico igual. Deve-se perceber que a nossa maneira de pensar, o nosso entusiasmo, a nossa força em estar vivos é essencial.

Mas não nos podemos alhear de que não somos especiais nem inéditos. Cada vez mais hoje vai haver mais gente com diferentes tipos de cancro, de diferentes histologias. Vão haver coisas esperançosas, mas também fases mais difíceis.”

E acima de tudo diz que “é importante fazer coisas que gostamos e ajudar os outros. Do que só nos focarmos em nós.”

O trabalho artístico pode ser como terapia, mas que no caso de Inês “tem sido sempre. O facto de fazer algo que vai ficar no mundo depois de eu desaparecer, torna a minha permanência menos relevante. Acreditar e achar que num dia que tiver que ir embora …fiz o melhor. É muito importante saber que fizemos o máximo que pudemos. Não dramatizar. Fazer coisa que gostemos, e lembrar que há sempre alguém pior do que nós.”

Seja Apoiante

O Estado com Arte Magazine é uma publicação on-line que vive do apoio dos seus leitores. Se gostou deste artigo dê o seu donativo aqui:

PT50 0035 0183 0005 6967 3007 2

Partilhar

Talvez goste de..

Apoie o Jornalismo Independente

Pelo rigor e verdade Jornalistica