O impacto social do descontrolo migratório (ingressaram 8 milhões de migrantes, dos quais 1 milhão e 700.000 ilegais e indocumentados), associado a um aumento do narcotráfico e criminalidade, sendo a adversária, Kamala Harris, o rosto do fracasso, já que era a única pasta que a Vice-Presidente tutelava na Administração Biden.
1. Quem tivesse seguido o valor médio das sondagens da Real Clear Politics (1) nos chamados “swing states” verificaria que nas últimas 3 semanas o candidato tinha uma pequena, mas consistente vantagem em 5 deles ( com relevo para a Pensilvânia), o que permitiria antever uma possível vitória em delegados caso não perdesse os estados onde usualmente sai vencedor.
O que verdadeiramente surpreendeu foi a sua vitória no voto nacional, a qual não sucedia há décadas com candidatos republicanos. Foi a empresa de sondagens Atlas Intel quem se aproximou com alguma precisão e consistência do resultado final prevendo uma maioria de +1%, se bem que a Rasmussen (+3%) tenha também acertado, pese ser uma empresa sempre otimista em relação a candidaturas republicanas
2. Quanto às razões da vitória, que foi robusta em todas as frentes sem ter sido esmagadora, (dada a distância relativamente curta em relação à adversária, exibido um País dividido em duas metades cujas franjas dominantes se detestam), sublinharia três delas:
i) A má performance económica da Administração Biden, com relevo para o aumento da inflação, tendo setores do operariado e eleitores latinos e negros que usualmente votam nos democratas, recordado que do tumultuado mandato de Trump, foi a Economia a área onde o mesmo teve sucesso;
ii) O impacto social do descontrolo migratório (ingressaram 8 milhões de migrantes, dos quais 1 milhão e 700.000 ilegais e indocumentados), associado a um aumento do narcotráfico e criminalidade, sendo a adversária, Kamala Harris, o rosto do fracasso, já que era a única pasta que a Vice-Presidente tutelava na Administração Biden.
iii) A exasperação de um setor maioritário das classes médias em relação à filosofia wokista que impregnou um setor do Partido Democrata, o qual se transformou uma federação de ativismos minoritários ligados a causas raciais, LGBT+, abortistas, climáticas, pró-palestinianas, pró-migrações reagindo a uma nova contra-cultura que publicamente pretendia substituir os seus padrões culturais de vida e coartar a sua liberdade de expressão.
3. Três desafios para a administração Trump
Em primeiro lugar existe o desafio da criação de uma melhor governance do que a primeira administração Trump que se revelou durante algum tempo, amadorística e caótica. Para além do temperamento caprichoso, barométrico e excessivo do Presidente eleito, erros de comportamento, de organização e de comunicação do passado devem ter sido apreendidos e serão provavelmente corrigidos por uma equipa de transição mais leal, profissional e operacional.
Por outro lado, o apoio maioritário no Senado e eventualmente na Câmara de Representantes ( bem como no Supremo Tribunal) criam uma “conjugação astral” para Trump poder aprovar uma boa parte das reformas económico-financeiras, migratórias, securitárias e educativas do seu programa. Contudo, os legisladores são muito dependentes dos eleitores dos seus círculos e dos lobbies que financiaram as suas campanhas.
Por isso, nos dois primeiros anos do seu primeiro mandato Trump apesar de ter idêntica maioria no Congresso foi derrotado em várias votações das suas propostas por dissidentes republicanos, ao que acresceu uma má relação com os chefes de bancada oriundos do establishment aristocrático do Partido Republicano.
Desta vez terá maior ligação ideológica aos congressistas do seu partido que se “trumpizou”, mas será importante garantir uma melhor articulação com novos Chefes de Bancada e aqui figuras como Vice-Presidente Vance e o independente Robert Kennedy que desistiu a seu favor podem ter importância.
Em segundo lugar terá o desafio de saber lidar com a contestação de rua com que os ativistas das minorias radicais impregnados por uma agenda de resistência e revanche irão brindar a nova administração, nas periferias das grandes metrópoles, nas universidades e numa imprensa que é esmagadoramente hostil e rábica contra o Presidente.
Trump tem uma agenda ideológica soberanista e populista e a direita radical que encarna veio chocar de frente com a extrema-esquerda. A deportação de migrantes ilegais e o combate contra-cultural provocará reações violentas organizadas e financiadas por estruturas ligadas ao capitalismo “woke” e as oposições procurarão explorar ou falta de firmeza ou ao invés excessos repressivos para deslegitimarem o presidente, apresentando-o como um ditador.
Esta tensão implicará uma luta pelo poder na comunicação social e em rede com conglomerados económicos disputando espaços: de um lado Musk e do outro a Open Society de Soros e da Fundação Bill e Melinda Gates.
Em terceiro lugar, a política externa será um desafio mais complexo, pois as intenções de Trump em por termo à guerra na Ucrânia mediante um acordo com Putin, desvalorizar a atual liderança da União Europeia, preferir relações privilegiadas com dirigentes soberanistas da Hungria, Itália, Holanda e Argentina, dar rédea solta a Netanyahu e hostilizar o poder da China mediante tarifas, serão resistidas pelo establishment do Pentágono, Serviços Secretos, Departamento de Estado e parlamentares republicanos.
Fala-se numa purga em forma de funcionários e militares desta elite administrativa. Ver-se-á com que dimensão, custos e benefícios.