MAGAZINE

CRISTINA CABRITA APRESENTA “ARTE À PROVA CEGA” NUM BLIND DATE COM OS ARTISTAS NA GALERIA 1758

Pedro Gaspar

Maria Cristina Ferreira Cabrita, arquitecta, artista e curadora de arte, apresenta ao público a Exposição “Arte à Prova Cega”, nos dias 6, 7 e 8 de Fevereiro um blind date com 25 autores, num conceito genuíno preservado “Arte por 30”. Todas as obras expostas serão adquiridas por um valor a partir de 30 euros.

A artista nasceu em Lisboa a 26 de agosto de 1984, é alfacinha de gema, revela a sua essência através da Galeria “1758”, na Ajuda, em Lisboa, dando forma a um mundo que se reinventa constantemente.

Valoriza, acarinha e cultiva as obras de todos os artistas que vão fazendo parte do seu mundo de forma presente, confiante e inspiradora. Com uma enorme intensidade.

Confessa, enfaticamente, ao Estado com Arte Magazine que faz tudo por amor sem esperar recompensas, porque “existe um sentido de missão superior”. Considera-se “eclética, num universo holístico, e está sempre muito atenta a todos os pormenores”. Manifesta carismaticamente: «Sou uma mistura curiosa de tranquilidade exterior e uma agitação interior constante. Sou metade emoção, metade geometria e planeamento, e, nesta balança, não sei o que pesa mais. Gosto de construir, de ver crescer, de transformar.»

É licenciada em Arquitectura pela Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, tem um mestrado em Arquitectura y Arte Efímera em Barcelona e Curadoria pela Sociedade Nacional de Belas Artes e Sotheby’s Institute of Art.

 Agora, é só descobrir a Cristina…

1758 – Qual foi o ponto de partida para esta galeria?

“1758” é a data que remete a um evento histórico local relacionado com a construção da Igreja da Memória, aqui mesmo próxima de onde estamos, na Travessa da Memória. No entanto, para mim, esta data tem um significado pessoal porque está associada à lembrança um amigo que fez parte do reabitar deste espaço.

O lugar onde a galeria agora existe foi, no passado, o antigo estúdio fotográfico da Ajuda, um lugar que recuperei para um projeto de curta duração (2017-2020) em colaboração com João Freire: a “WineRoom – Lisboa 1758”. Era um espaço dedicado ao convívio, à partilha de cultura e ao prazer da boa conversa com um copo de vinho. Após o encerramento da WineRoom, durante a pandemia, e com a partida do João, encontrei na arte o meu próprio caminho de cura, reflexão e auto-descoberta.

No início de 2022, decidi dar ao espaço uma nova direção criando um lugar que se tornou, para mim, um santuário de cura e expressão. Esse foi o momento em que a galeria nasceu, como um estúdio, mas também como um refúgio onde a arte é entendida como amor e cura.

A Galeria 1758 tem como propósito ser um espaço de acolhimento e partilha, onde a arte serve como meio de comunicação e expressão de sentimentos profundos. É um lugar onde se celebram o amor e as relações humanas, um espaço aberto a todos aqueles que querem partilhar a sua paixão e encontrar um ambiente que os inspire. A arte, para mim, é sempre um veículo de cura, e a galeria é o lugar onde esse processo se torna visível e acessível a todos.

Tela de Cristina Cabrita

Quem é a Cristina Cabrita?

A Cristina, tal como a conheço, é uma mistura curiosa de tranquilidade exterior e uma agitação interior constante. Sou metade emoção, metade geometria e planeamento, e, nesta balança, não sei o que pesa mais. Gosto de construir, de ver crescer, de transformar.
Desde pequena, sempre me reconheci como uma pessoa introvertida, sensível e extremamente atenta aos detalhes. Embora não venha de uma família com uma tradição de artistas ou arquitetos, o meu gosto pelo desenho e pela pintura sempre foi claro, desde cedo. Não sei explicar ao certo porquê, mas encontrei na arte uma forma natural de expressão.
Tenho uma ligação especial com a beleza das ruínas, dos espaços deteriorados, dos vazios. Gosto da transformação e de dar nova vida, nova alma, a esses lugares. Para mim, a arte é sobretudo uma busca pela expressão do amor e uma missão interior de transformar e construir algo que perdure.
Acredito que esta é a minha essência: encontrar-me através da arte e, por ela, dar forma a um mundo que se reinventa constantemente. É através da arte, em geral, que me encontro e me regenero.

Voltar atrás e fazer tudo de novo?

A arte é um caminho árduo, muitas vezes solitário, movido por sonhos, por um amor profundo e por uma coragem que surge nos momentos mais desafiadores. O percurso que me trouxe até aqui foi longe de ser linear; foi repleto de paragens, retrocessos e perdas. Porém, cada um desses momentos contribuiu para o que sou hoje. Foi um caminho rico em experiências, encontros e desencontros, e, olhando para trás, não consigo dizer com certeza o que faria ou deixaria de fazer. Tudo fez parte de um processo.
Acredito que todas as descobertas e os esforços aparentemente sem sentido acabam por se revelar, dia após dia, na nossa capacidade de enfrentar os desafios quotidianos. Cada etapa foi válida, porque foi vivida com a energia e a capacidade que possuía naquele momento. E é assim que continuo a caminhar.

Não tenho uma visão clara de tudo o que foi feito, mas, se pudesse alterar algo, mudaria apenas os fatores externos que influenciaram o ritmo de construção da galeria — o medo, a saudade… Mas é precisamente nesses momentos de escuridão que a fé se revela, e a fé é, para mim, o que tem guiado este caminho.
Portanto, faria tudo novamente. Mesmo as coisas das quais já não me lembro. Porque cada parte do percurso teve o seu valor e o seu propósito.

Rentabilizar o espaço: qual a sua opinião sobre workshops e aulas de pintura?

Uma das grandes riquezas que este espaço me possibilita é a oportunidade de receber e de me conectar com a sensibilidade das pessoas. Nunca tive, de forma direta, a intenção de dar workshops, até porque, embora tenha formação em Arquitetura, não tenho a Academia das Belas-Artes, sou uma auto-didata absorvendo de fontes de alguns artistas com quem aprendi diretamente ( Rui Carruço, Maria Flores, Ana Lima-Netto). No entanto, ao longo do tempo, comecei a transmitir o que sei, desafiando-me a aprender também com os aqui vêm, num processo contínuo de troca e experimentação.
Inicialmente, os pedidos vieram, sobretudo, de pais que queriam sessões experimentais para os filhos, mas também de adultos. E, com isso, fui oferecendo workshops com mais frequência, o que me permitiu perceber o quanto esses momentos são valiosos — tanto para quem participa, como para mim mesma. Hoje, tenho grande prazer em acolher artistas que têm algo para partilhar e ensinar, pois acredito que o espaço deve ser também um ponto de encontro e troca de saberes.
Para mim, os workshops não são apenas uma maneira de rentabilizar o espaço, mas sim uma oportunidade para promover a experimentação e a prática do processo criativo. O que me interessa, acima de tudo, é proporcionar um ambiente onde as pessoas possam explorar e vivenciar o processo criativo em toda a sua complexidade, com tudo o que ele envolve.

Os workshops na galeria abrangem várias áreas artísticas, como cerâmica, desenho, pintura, entre outras. O objetivo é sempre o mesmo: explorar, experimentar e transformar. Esse é o propósito central dos workshops que aqui oferecemos.

Galeria “1758” na Ajuda

Como arquiteta em que perspetiva vê o mundo?

Como arquiteta, vejo o mundo como um espaço em constante transformação — não apenas em termos físicos, mas também no que diz respeito às relações humanas, sociais e culturais. Para mim, a arquitectura é uma linguagem que traduz as necessidades, os desejos e os sonhos de uma comunidade num espaço tangível. A forma como interagimos com o ambiente, como nos conectamos com os outros e como criamos os nossos próprios lugares de pertença, tudo isso está profundamente interligado.
Vejo a arquitectura como um reflexo da nossa sociedade, das suas complexidades e da sua evolução. Acredito que a arquitectura tem o poder de moldar a nossa experiência do dia-a-dia — seja através de um edifício que nos acolhe, de um espaço público que nos conecta ou de um pequeno detalhe que nos faz sentir em casa. Cada intervenção no espaço é uma oportunidade de re-imaginar o mundo ao nosso redor e de contribuir para a construção de uma realidade mais equilibrada e inspiradora.
O mundo é um lugar onde as fronteiras entre o natural e o urbano, o tradicional e o contemporâneo, se dissolvem de maneira fascinante. Não vejo a arquitectura apenas como a criação de estruturas, mas como a criação de experiências sensoriais e emocionais, onde a luz, textura, temperatura e vazio contribuem para que as pessoas possam encontrar a harmonia entre o seu ser interior e o espaço que ocupam.

É uma relação covalente as suas duas profissões? Com parâmetros que correspondem a padrões?

Sim, vejo a prática de arte e arquitetura como uma relação covalente, no sentido em que ambas se interligam e se enriquecem mutuamente. Embora sejam disciplinas distintas, partilham uma base comum de pesquisa sobre o espaço, a forma, a percepção e a experiência humana.
A arquitetura é também a arte do espaço, do cheio e vazio, da luz e das sombras, das texturas e dos materiais. Essa abordagem permite explorar a escala humana de uma forma muito particular, criando experiências sensoriais que, muitas vezes, são difíceis de alcançar numa obra de arte de galeria. A arquitetura lida com o espaço físico e com a relação das pessoas com esse espaço, mas ao mesmo tempo, é uma forma de arte que proporciona uma fruição sensorial mais completa, mais imersiva, que vai além do visual e toca o emocional.
Na pintura, também se trabalha a ideia de espaço e composição, explorando como as formas podem interagir para criar uma narrativa visual. Ambas as práticas lidam com a materialidade, a luz, a proporção e a harmonia, mas de maneiras diferentes, dependendo da sua intenção.
A recuperação de imóveis, por exemplo, tem sido uma grande fonte de inspiração na minha prática. Muitas vezes, aproveito testes de materialidade desses edifícios para desenvolver ideias, explorando como diferentes materiais, como argamassas, texturas e acabamentos, podem ser transformados em elementos artísticos. Uma parede antiga, com suas camadas de texturas, cores e histórias, é para mim um campo fértil de experimentação. Essas camadas não são apenas vestígios de tempo, mas também testemunhos sensoriais e emocionais que são potenciais partes da uma pintura.
Quanto aos parâmetros e padrões, sim, existem algumas semelhanças. Na arquitetura, lida-se com normas técnicas e práticas funcionais, enquanto na pintura, os padrões podem estar mais ligados a convenções estéticas e princípios compositivos.
Para mim a relação entre arte e arquitetura é dinâmica porque cada uma oferece um espaço para explorar as possibilidades da outra.

A conexão com esta arte foi um amor à primeira vista?

A conexão com o desenho e a pintura estão presentes nas minhas memórias mais antigas. Desde muito cedo, fui uma observadora atenta aos detalhes que me rodeavam, sempre captando nuances que muitas vezes passavam despercebidas. Acredito que cedo encontrei no desenho e na pintura uma maneira de ampliar essas observações, de significar os pequenos detalhes do meu olhar. Com a idade, foi crescendo o interesse pela história de arte e em paralelo, pela experimentação de materiais. A arte tornou-se uma linguagem pela qual eu podia traduzir e compartilhar o que via e sentia.
Não me lembro de um momento específico em que isso começou — a conexão sempre esteve lá, como uma extensão natural de quem sou. A arte foi uma forma de expressão que me permitiu dar forma e profundidade ao mundo interior que, de outra forma, ficaria limitado ao plano das minhas observações.

Como define os estilos dos autores na galeria?

Mais do que técnicas e estilos, o que define os artistas da galeria é o amor genuíno pela arte. Os artistas da galeria compartilham mais do que uma afinidade pela arte — são também amigos, unidos pelo amor à criação e pela convicção de que a arte é um veículo de conexão humana. O que torna esse laço ainda mais forte é a diversidade de estilos, técnicas e histórias que cada um traz consigo. Cada artista possui uma linguagem única, com temas e cores que o definem, o que nos permite criar um universo plural e vibrante. Juntos, proporcionamos uma experiência rica em imagens, emoções e partilha. O nosso objetivo é estreitar o relacionamento com o público e garantir que a arte seja acessível a todos, sem exceção. Queremos que a arte seja por todos e para todos.

Como artista, quais são as suas influências?

Acredito que todas as experiências, sejam elas pessoais ou artísticas fazem parte da forma única com que cada um dialoga com o mundo. No meu caso, a arquitetura e o desenho de cidades têm uma forte influência, especialmente no desenho das paisagens urbanas.
Também encontro inspiração na dança, sendo as bailarinas, ou as solitárias, um dos temas recorrentes da minha pintura e onde procuro explorar e transmitir a essência feminina.
Sou profundamente inspirada pelas palavras de José Tolentino Mendonça, cujas reflexões me levam a viajar e me ajudam a interpretar temas centrais do meu propósito artístico.
As conversas com a artista Ana Lima-Netto também são igualmente essenciais no meu processo de introspeção artística.
Quanto às influências pictóricas, as cores vibrantes e os nenúfares de Monet falam-me diretamente em dias mais alegres, enquanto a luz quebrada sob fundos negros de Rembrandt e Rubens ressoam nos meus momentos mais introspetivos. As paisagens difusas de Turner, com o seu mistério e leveza, são também fonte de inspiração.
Devo fazer menção a Rui Carruço e Maria Flores que tanto contribuíram para o desenvolvimento da minha abordagem à pintura.

Uma relação entre a sua arte e algo contemporâneo?
Acredito profundamente que a arte é para todos e por todos. Num mundo contemporâneo marcado por rápidas transformações e desafios sociais e culturais, sinto que a arte deve ser uma linguagem inclusiva, capaz de se conectar com o público de forma ampla e genuína. Gostaria que a minha criação refletisse essa visão, procurando criar uma ponte entre a arte e as pessoas, permitindo que todos, independentemente do seu background ou contexto, possam se ver representados e, de alguma forma, tocados pelas obras.
No contexto contemporâneo, estamos a viver uma era de intensas mudanças sociais, tecnológicas e culturais, e que a mim me cria uma sensação de desconexão. Quando pinto procuro captar essas contradições, abordando temas como a alienação nas cidades, ou a solidão em bailarinas solitárias. Estas questões são, a meu ver, profundamente contemporâneas e universais.
Entendo que a arte não deve se isolar em esferas elitistas ou inacessíveis. Ela deve ser um canal de diálogo aberto, acessível e que desperte emoções e reflexões, independentemente de quem a observa.

Tem alguma assinatura nas suas obras que ressalte alguma simbologia?
É uma espécie de gatilho emocional?

Sim, as minhas telas carregam uma simbologia que reflete profundamente a minha visão sobre o mundo e as emoções que me movem. Mulheres solitárias e cidades despovoadas são temas recorrentes na minha pintura, e cada um deles é, de alguma forma, uma manifestação de algo interior. A mulher, muitas vezes isolada, representa a dualidade entre a força e a fragilidade, a solidão que se transforma em poder. Ela é uma figura que carrega em si uma profunda intensidade emocional. A solidão, neste contexto, é quase uma metáfora para a introspeção e a busca por significado num mundo que muitas vezes parece desconectado.
A pintura de paisagens ou cidades despovoadas surge quase como uma forma de escutar a “alma urbana”. Fascina-me a possibilidade de pintar as cidades em silêncio, por contraste à agitação do dia-a-dia. A ausência de movimento humano permite captar a essência da geometria própria de cada cidade quase como se estas falassem uma linguagem íntima.

Seja Apoiante

O Estado com Arte Magazine é uma publicação on-line que vive do apoio dos seus leitores. Se gostou deste artigo dê o seu donativo aqui:

PT50 0035 0183 0005 6967 3007 2

Partilhar

Talvez goste de..

Apoie o Jornalismo Independente

Pelo rigor e verdade Jornalistica