MAGAZINE

Pode um cientista ser Cristão?

Bernardo Motta e Gonçalo Andrade

Esta pergunta, à qual devemos responder na afirmativa, noutros tempos nem se colocaria. Só se coloca hoje em dia porque vivemos mergulhados numa visão materialista da realidade, segundo a qual tudo o que existe é redutível à matéria.

Nessa perspectiva, não existiriam conceitos abstractos ou imateriais, e o universo, a evolução dos seres vivos e do ser humano não teriam qualquer propósito objectivo (independente do sujeito). O ser humano seria puramente material desprovido de livre-arbítrio, e a moral não passaria de uma convenção social, pois não existiriam verdades morais objectivas. Além disso, Deus não existiria e as religiões seriam todas construções humanas: nenhuma religião seria verdadeira. Este é o ambiente intelectual deste Ocidente pós-Cristão, e quem o aceita acaba por encontrar alguma incompatibilidade entre fazer Ciência e ser Cristão.

No entanto, a experiência humana é difícil de harmonizar com o materialismo. Por exemplo, o diálogo entre pessoas é possível, o que pressupõe a existência de leis e verdades lógicas, universais e eternas, como o princípio da não-contradição. Essas verdades não se reduzem à matéria e, no entanto, o ser humano compreende-as e usa-as, o que sugere que há algo no ser humano capaz de as alcançar, algo imaterial. Já o livre-arbítrio é fundamental para o conhecimento humano, para podermos dialogar e raciocinar, distinguindo-nos das máquinas.

O matemático Roger Penrose, que não acredita que Deus exista, não aceita o materialismo e defende a existência de três domínios interconectados: o matemático, o físico e o mental. O filósofo Thomas Nagel, também ele descrente em Deus, critica o materialismo e considera a razão como uma “autoridade universal” transcendente à matéria. 

Bernardo Motta e Gonçalo Andrade têm o podcast ”Café Ciência e Fé” no qual abordam várias questões em torno da relação entre o Cristianismo e a Ciência. https://www.youtube.com/@cafecienciaefe
Bernardo Motta e Gonçalo Andrade têm o podcast ”Café Ciência e Fé” no qual abordam várias questões em torno da relação entre o Cristianismo e a Ciência. 

A perspectiva teísta clássica, oposta ao materialismo, assenta no conceito de Deus desenvolvido na Grécia Antiga e aprofundado pelo Cristianismo: Deus é o Logos (razão divina e criadora) e a “causa primeira” de tudo o que existe. Deus é imaterial, eterno, perfeito e necessário, ou seja, a Sua existência não é contingente. Ele criou um universo lógico, matemático e belo, com leis imutáveis e um propósito.

O ser humano, criado “à imagem e semelhança de Deus”, partilha características imateriais com o Criador, como o intelecto e o livre-arbítrio, ainda que imperfeitos. Há cada vez mais interesse pela existência de Deus. Apenas dois exemplos: o filósofo Edward Feser publicou em 2017 o seu livro “Five Proofs of the Existence of God”, contendo cinco novos argumentos para a existência de Deus inspirados em Aristóteles, Tomás de Aquino e Leibniz. E dois Engenheiros Franceses, Michel-Yves Bolloré e Olivier Bonnassies, publicaram recentemente o seu “best-seller” “Deus – a Ciência – as Provas”. 

Enquanto que é difícil conciliar a experiência humana do diálogo racional e da liberdade com o materialismo, por outro lado, na perspectiva teísta clássica, estes surgem com naturalidade.Também a estrutura matemática do universo, descrita por Eugene Wigner (Nobel em Física em 1963) como um “milagre”, surge como consequência desta perspectiva. A imutabilidade das leis do universo, expectável com um Deus Racional e Fiel, tornam possível a sua compreensão.

Verdades lógicas, matemáticas e morais, que sempre existiram, mesmo antes do surgimento do Homem, são facilmente explicáveis se provêm da mente eterna de Deus. Visto desta forma, o teísmo clássico fundamenta a lógica, a matemática, a confiança nos sentidos, o método científico e a busca pelo sentido da vida, permitindo compreender o universo e sustentar o diálogo racional: a fé racional dos Cristãos e a Ciência não são incompatíveis, mas complementares. 

Como Newton afirmou acerca do nosso sistema solar, “este belíssimo sistema de sol, planetas e cometas só poderia proceder do conselho e domínio de um ser inteligente”, desse Deus a quem Newton chamou o “Governante Universal”, cuja inteligência e leis se manifestam na ordem do cosmos.

Bernardo Motta e Gonçalo Andrade são engenheiros, têm o podcast ”Café Ciência e Fé” no qual abordam várias questões em torno da relação entre o Cristianismo e a Ciência.

Partilhar

Talvez goste de..

Apoie o Jornalismo Independente

Pelo rigor e verdade Jornalistica